Conheci um senhorzinho, danado pra
prosear, mastigava capim no talo pra poder passar o tempo. Enquanto falava
seus causos antigos dava pra ver em seu sorriso a nostalgia daquela memória,
contava da Rita nega que quando passava pela rua, levava no vestido a paixão que ele sentia no peito. O modelo que ela vestia era todo feito na renda, com
florzinhas miúdas, alça amarrada nos ombros, riqueza de detalhes que só ele sabe contar. Tinha cheiro de
alfazema nos cabelos, falha engraçada entre os dentes, uns cachos que não
ficavam no lugar, voavam para um lado só, formando um par gentil de antenas. Quando
dava Sete de Setembro e o vilarejo se juntava pra comemorar, essa era a melhor hora
de namorar a Rita nega, que saía fugida pela janela de casa.
Era forró a noite inteira,
fartura de comida que não acabava mais, bebida a vontade e sanfona também. Até
hoje só uma coisa ele não se lembra se o primeiro beijo que roubou da Rita foi
na praça a luz da lua ou escondido atrás da igreja. Sabe que nesse dia fazia um calor de moer e as ruas carregavam um perfume abafado, parecido com jasmim.
Hoje com 80 anos de idade, diz
que viver tanto tempo não vale assim muito a pena, o que vale na verdade é aquilo que acontece no intervalo do tempo, a lembrança que não se apaga, o espasmo de
alfazema no cacho de antena, a renda trabalhada na cor, o amor vivido pela Rita nega, o beijo
roubado no dia da independência, a saudade sentida com cheiro de flor.
- Carine Morais